Saturday, April 11, 2015

CONSUMIMÉTICO

Do ponto de vista da minha adolescência, os editores, em Portugal e em ditadura, resumiam-se a duas categorias, os corajosos e os outros. Isto quando Portugal era um país em grande parte analfabeto, com pouco interesse por coisas culturais e que dizia tudo em inho. Acabou-se-me a adolescência e também se acabou a ditadura, a nossa grande desculpa para sermos corajosos. Seguem-se duas décadas de marés, cada vez mais semelhantes mas ainda sob algum efeito da mudança de regime, a Europa, a internet, o novo século, o 9/11, o euro, os abalos financeiros, os senhores da guerra, as epidemias e... em Portugal sobrevive o efetivo analfabetismo e a fraca curiosidade intelectual, cuja se limita a testar as novidades nascidas fora, e uma tépida diversidade cultural, também inserida por imitação, que se quer já adaptada à ânsia de tudo mercar o mais depressa possível. A sociedade portuguesa é, então, aquilo a que chamo uma sociedade consumimética, virada para uma simplória e fácil orientação dos gostos. Divergências, ideias originais ou polémicas nascidas no seu interior esbarram contra ela, tal como se esbarra contra uma fila compacta de clientes de supermercado com o nariz enfiado no folheto das promoções. Uma coisa é vender livros num supermercado, outra, mais perigosa, é submeter a edição às suas regras. Se editores e programas de governo para promover as letras e as artes se submetem às regras de supermercado, na mira de sucesso e de lucro rápidos, não obterão mais que magros lucros quando comparados com o custo das fragilidades culturais e da dependência, que se seguirá, com o tempo. É um preço muito pesado para apenas ver uns dinheiros a circular de uns bolsos para outros. Ainda acabam, acossados pelo fantasma que ajudaram a criar, a esconder-se da própria sombra.

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